PROPOSTA DO FESC/MS PARA A CULTURA - ENTREGUE NA II CONFERÊNCIA DA CULTURA
INTRODUÇÃO
Não vemos como o Governo do Estado possa - na área da cultura, através da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul (FCMS), e o governo federal - através do Ministério da Cultura (Minc), diante da urgência em efetivar (uma vez que o momento histórico assim exige) uma política clara, organizada, abrangente, realmente integrada, tecnológica e funcional, em conjunto com os municípios - prescindirem da coragem e iniciativa necessárias para tanto.
E efetivar tal política é neste momento, para a FCMS, uma necessidade evidente, prioritariamente colocada. Seja por ela representar a ligação, o elo, entre o poder federativo e os municípios, no âmbito do setor público, seja pela necessidade de levar a efeito suas próprias políticas.
O Seminário do Plano Nacional de Cultura em MS nos oferece importante oportunidade para debatermos os parâmetros necessários para a cultura - do município ao âmbito federal, mais ainda por vermos o PNC em debate de certo modo como um “contraponto” ao ponto de partida que entendemos necessário.
Na realidade, colocada a questão entendemos que a organização estadual e nacional da cultura deve passar a ser trabalhada pelo alicerce do âmbito federativo: o município.
O texto em debate não surpreende, propondo ações importantes como valorizar a diversidade, o intercâmbio, tratar da produção, difusão e distribuição de produtos, de equipamentos (cineclubes, telecentros, pontos de cultura, bibliotecas etc.).
Mostra também que o governo federal continua a pressupor – certamente devido ao real distanciamento político e administrativo existente, que a cultura nos municípios esteja “pronta”, que existe de modo suficientemente valorizado, organizado e equipado, apto, portanto, ao trabalho em rede necessário, o que não acontece.
Na realidade o PNC quer atribuir à área cultural dos municípios mais uma infinidade de ações sem levar em conta a situação predominante. Parece ignorar que dentro de um processo histórico, caracterizado pela ausência quase total de políticas públicas (estadual ou federal) descentralizadoras, municipalistas (em todas as áreas) eles (municípios) não dispõem na quase totalidade - como em MS - de padrões nas diversas capazes de viabilizar em rede, em conjunto, neste momento, de forma satisfatória, as políticas propostas. Insistir nisso seria jogar boa parte do dinheiro fora.
O PNC, como muitas vezes acontece em políticas nacionais, está passando ao largo de ações mais básicas. No sentido contrário, utilizando o ditado popular queremos dizer: “o buraco é mais embaixo”.
Claro também, e sem suspense - dado o notório quadro existente - é que uma política de cultura de alcance realmente estadual, abrangente e funcional implica para nós em criar - a partir de parcerias da FCMS com cada município interessado (e estimulado) (com o apoio do Ministério da Cultura) - estruturas locais (municipais) permanentes, com base institucional, física, administrativas, de pessoal e o que mais for necessário para promoção de políticas integradas.
Fundamental, portanto, é trabalhar de forma a estabelecer padrões que permitam promover - com uso das facilidades tecnológicas, em rede, a interação entre a área cultural do município e as do Estado (FCMS) e do país (MINC). Aliás, esse é um dos pontos centrais não só do Plano Nacional de Cultura como do Sistema Nacional de Cultura.
É possível comparar o cenário atual da política nacional de cultura (governo federal + estados + municípios) como um quebra cabeças, para o qual estão faltando peças importantes.
As ações necessárias podem sem dúvida serem colocadas em prática com relativa facilidade e dentro da melhor relação custo-benefício, mas a partir de uma primeira conclusão básica (1):
O PONTO DE PARTIDA É A SITUAÇÃO ENFRENTADA PELA ÁREA DA CULTURA NO MUNICÍPIO, componente celular dos estados e do país.
NÃO ENCONTRAMOS A HISTÓRIA PRONTA
Para entendermos melhor as dificuldades enfrentadas para valorização e organização da área da cultura nos municípios, temos que começar por lembrar que na esfera federal a área da cultura separou-se da área da educação há apenas 23 anos.
Na maioria das cidades (incluindo as de MS), por sua vez, essa emancipação ainda não ocorreu. A cultura continua predominantemente ligada às secretarias de educação, ou outros órgãos, sem nenhuma autonomia financeira ou política. (ANEXO 01).
O Ministério da Cultura foi criado em 1985 e em 1990 foi transformado em Secretaria da Cultura, voltando a ser ministério em 1992. Em 1999 teve ampliados seus recursos e reorganizada sua estrutura, sendo novamente reestruturado em 2003. É uma existência tanto recente quanto repleta de mudanças, que com certeza contribuem para desenvolver, aperfeiçoar suas estruturas e suas políticas.
Constatamos desse modo que se no plano federal a organização da área da cultura é recente e só agora encaminha medidas como debates sobre a elaboração de um Plano Nacional de Cultura e do Sistema Nacional de Cultura, nos municípios uma política definida, organizada e articulada nesse setor nunca existiu. Salvo, provavelmente, raras, honrosas e autóctones exceções.
Mais ainda, diante do mesmo quadro histórico sequer a política cultural em MS, de modo amplo, permanente e funcional NÃO ESTÁ DEFINIDA COM A CLAREZA E A FUNCIONALIDADE NECESSÁRIAS, embora não tenhamos duvidas de que a FCMS esteja no caminho certo.
INTERESSE COMUM E AÇÃO CONJUNTA SÃO PREMISSAS
Um princípio básico para qualquer ação na área da cultura é com certeza constitucional: “ninguém pode ser obrigado a associar-se ou a permanecer associado”.
O preceito, aliado à autonomia também constitucional dos municípios, conduz inevitavelmente à busca de soluções com base em interesses comuns, nas afinidades. E quais são essas afinidades?
A primeira – assim acreditamos - diz respeito ao interesse cívico, político, tanto com relação ao município como ao Estado: buscar o bem-estar da sua população.
Para isso o mandatário foi eleito. E administrador que se preze deve se preocupar com a cultura por entender que ela é importante, tanto para a economia quanto para a formação da identidade local. E que tem políticas, estadual e federal para ampará-la. Não vê quem não quer.
Outro argumento, forte e verdadeiro, é que ao não se interessar por uma parceria com a FCMS e o Minc para organização, padronização e desenvolvimento conjunto da área da cultura o município terá sérias dificuldades para interagir e ser beneficiado por programas, projetos, verbas ou ações, seja da administração estadual ou da federal.
Não vai dispor sequer na maioria das vezes dos mecanismos básicos, técnicos e administrativos, fundamentais para as interações necessárias.
O trabalho de procurar as novas administrações municipais para montar uma rede – do interesse de todos – deve ser levado a efeito por parte da FCMS com apoio do FESC/MS (Fórum Estadual de Cultura de MS) a partir de um projeto bem definido, montado com base em leitura fundamentada e capaz de oferecer nitidamente vantagens para as partes. O caminho é o do convencimento, do reconhecimento das vantagens com base em uma boa proposta.
Conclusão (3), ALÉM DE AÇÃO POLÍTICA É UMA AÇÃO ADMINISTRATIVA CONJUNTA, SINCRÔNICA, ONDE TODAS AS PARTES, INCLUINDO O GOVERNO FEDERAL, GANHAM.
DEFININDO CONJUNTAMENTE UM ROTEIRO DE AÇÃO
Concluída a fase do entendimento, fechada a parceria e acertados interesses comuns é preciso haver o cuidado de não queimar etapas.
Em outras palavras, da mesma forma que ocorreu no plano federal um primeiro compromisso do município é valorizar a área cultural – entendendo, em definitivo, que ela existe nos dias de hoje dentro de um universo próprio - e que não é mais (ou não deve ser) vinculada à política de nenhum outro setor (salvo em ações conjuntas).
A área da cultura tem seus fundamentos, leis e orçamentos, tanto no plano do país quanto no do Estado e contribui para o desenvolvimento econômico e para a formação e fortalecimento identidade da população e do país. No plano histórico agora é a vez do município.
Conclusão (4) TRABALHAR, PELA ORDEM, COM CRITÉRIOS, A ORGANIZAÇÃO DE TODAS AS FASES NECESSÁRIAS
EMANCIPAR SOB RISCO DE DEFASAGEM E ISOLAMENTO
A área da cultura deve – portanto, como vemos - em cada município, ser na prática emancipada e dotada de estrutura administrativa e orçamentária própria. É uma constatação tão lógica quanto necessária para que os prefeitos não sejam surpreendidos - por exemplo - pela aprovação de uma hora para outra da PEC 150.
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 150 é, aliás, um dos pontos centrais abordados pelo Plano Nacional de Cultura (PNC) - uma das suas prioridades: “A aprovação, em caráter de urgência, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 150/03 pelo Congresso Nacional e a garantia pelo Poder Executivo da destinação prioritária para políticas públicas de cultura”.
Ela (PEC 150) vincula para a cultura o mínimo de 2% no Orçamento da união, 1,5% no orçamento dos Estados e Distrito Federal, 1% do orçamento dos municípios.
A atualidade do debate nacional sobre o assunto nos fornece um bom parâmetro para comparar o avanço no plano do país com a situação predominante nos municípios – ainda agindo como baratas tontas.
Um projeto abrangente para a organização, em rede, da área cultural dos municípios deve levar em conta os seguintes aspectos:
1 - ADMINISTRATIVO
A percepção da importância da área da cultura pelo município (através de seus administradores e da sua população) deve levá-lo a concluir pela necessidade de, com a maior rapidez, fazer com que a cultura exista enquanto instância própria.
O PNC já orienta nesse sentido: “Estimular a criação e implantação de secretarias específicas de cultura e/ou fundações com orçamentos próprios nos estados e municípios”.
A FCMS pode e deve entrar nessa briga ampliando seus trabalhos de consultoria para sugerir, por exemplo, qual o modelo administrativo mais adequado para cada caso, tais como secretaria, fundação, departamento etc., e eventualmente suas subdivisões: como coordenadorias, gerências, núcleos, etc. O que são, para que servem, porque utilizá-las ou não.
Pode utilizar critérios como a população existente em cada local e fornecer modelos, orientações jurídicas, orçamentárias, técnicas etc., necessárias para implantar a opção. A FCMS (e o Minc) podem com certeza prestar uma ampla consultoria administrativa.
2 - JURÍDICO
Outra ação fundamental para que a cultura dos municípios interessados adentre o século XXI e interaja com as demais esferas é a existência de uma legislação municipal regulamentando o setor.
É desse modo que o município vai dispor dos meios legais necessários para as ações, locais e externas. A legislação regulamentará, por exemplo, um Plano Municipal de Cultura, o Conselho Municipal de Cultura e o Fundo Municipal de Cultura.
Nesse sentido é importante frisar que a não existência de tais mecanismos, a começar pelo Conselho Municipal de Cultura já é hoje fator impeditivo para que os municípios de MS obtenham financiamentos do FIC (Fundo de Investimentos Culturais), da Fundação de Cultura de MS.
Quanto à importância dos conselhos municipais a FCMS até mesmo realizou seminário em 2007, fornecendo entre outras orientações modelos de lei para criação de conselhos municipais de cultura. Excelente trabalho, que deve ser valorizado novamente – dentro de um projeto mais amplo.
3 - FÍSICO
O Governo do Estado, através da FCMS, deve criar e propor, juntamente com o Ministério da Cultura, projeto semelhante ao Programa Nacional de Apoio à Gestão Administrativa e Fiscal dos Municípios (PNAFM), do Ministério da Fazenda.
O PNAFM visa à melhoria da atividade administrativa da gestão pública municipal, destacadamente na área financeira, auxiliando na aquisição de equipamentos de infra-estrutura e de informática - no apoio e na comunicação.
Ou seja, a FCMS e o MINC podem, dentro do programa, doar aos municípios parceiros - que não disponham de equipamento (próprio da área da cultura não de outro órgão) um KIT constituído por micro-computador, impressora, escrivaninha e cadeira (ou o que mais for considerado necessário).
O valor de cada kit certamente não chegaria a R$ 2.500,00. Fazendo as contas, se em MS fosse necessária a doação de 100 kits (o número deve ser menor) o valor total será de R$ 250.000,00. Falando também popularmente, dinheiro de chipa diante dos R$ 90 milhões que teriam sido gastos na gestão anterior.
O mesmo programa (do Ministério da Fazenda) oferece também capacitação, consultoria, infra-estrutura e administração de pessoal. Abrange quase exatamente as mesmas áreas que descrevemos aqui. Não precisamos, previsivelmente, reinventar a roda.
Com certeza podemos criar nosso próprio modelo, já que cada lugar preserva suas peculiaridades, com base em experiências bem sucedidas.
Outros aspectos a serem considerados são a necessidade da manutenção dos equipamentos e o custeio das atividades desenvolvidas (material de consumo como tinta para impressoras, papéis, etc.).
4 - HUMANO
A primeira sugestão para um administrador municipal é colocar frente à pasta uma pessoa efetivamente interessada, identificada com o assunto, que entenda a importância da cultura para o município. São qualidades que podem contribuir para tornar o gestor mais versátil, desenvolto e integrado para aprender e para interagir. A pasta não pode ser tratada como um cabide de emprego – deve haver a maior afinidade possível da pessoa com o cargo.
5 - GESTÃO
Uma vez que a área da cultura do município se encontre dotada de estrutura: 1) administrativa (o órgão adequado/indicado para funcionamento da área da cultura local), 2) jurídica (as leis necessárias tanto para o próprio município quanto para interagir com o Estado e o Governo Federal), 3) física (local e equipamentos, as ferramentas de trabalho), 4) de custeio (que garanta as condições de funcionamento permanente do trabalho), vem o essencial: A GESTÃO. Que ações realizar?
Nesse sentido, começamos por duas sugestões:
A) a primeira é iniciar um trabalho continuado de formação dos gestores para a área da cultura - começando por uma formação básica, que pode contar com a ajuda de cartilhas, internet, vídeos e outras mídias.
Cabe nesse trabalho (de formação) um dos princípios do jornalismo (já que se trata de comunicação) - o de que o jornalista não deve pressupor que todos os leitores conheçam da mesma forma o assunto que está sendo tratado - e que é preciso sempre relembrar informações fundamentais. O objetivo é “situar” o leitor. No caso, o gestor.
A formação de um gestor cultural, levada a fundo, certamente justifica até mesmo uma cátedra específica nas universidades brasileiras – a de GESTOR CULTURAL. É possível que em futuro não muito distante a formação, técnica ou superior na área, seja requisito para o desempenho do trabalho.
Entre inúmeros assuntos o gestor deve aprender sobre a história da arte e da cultura, quais são e o que fazem os órgãos ligados à cultura (no Estado e no país), atribuições e políticas desenvolvidas, subdivisões (secretarias, fundações, secretarias, gerências, etc.), legislação existente (Constituição, Lei Estadual 2.726, etc.), financiamentos (FIC, FNC, Lei Rouanet, etc.).
B) A segunda providência refere-se ao encaminhamento, também de imediato de ações locais voltadas para a construção da organização, em rede, a partir dos moldes propostos e da parceria efetivada.
Enfatizar que no Estado existem oito áreas de produção cultural e no federal 10 e quais essas áreas.
A realização, de imediato, no município – com apoio da FCMC de inventário e diagnóstico da cultura local como ações prioritárias, cadastrando artistas, equipamentos etc.
Delasnieve Miranda Daspet de Souza
Secretária Executiva do Fórum de Cultura de Mato Grosso do Sul
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