domingo, 25 de julho de 2010

Para falar de paz, necessitamos falar de guerra?

Matéria que enviada por  FMenezes@aol.com

Latino-americanos entre guerrilha, narcotráfico e circo


Ranulfo Bocayuva l A TARDE

Se forem realmente comprovadas as acusações da Colômbia de que a Venezuela abriga, em seu território, guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e do Exército da Libertação Nacional (ELN), todos os países da região amazônica, incluindo o Brasil, têm razão de sobra para não somente se preocupar, mas para reforçar militarmente suas fronteiras.

A denúncia, que já provocou rompimento diplomático por parte de Caracas e a esperada escalada de tensão venezuelano- colombiana, acirrada pelo estilo intempestivamente teatral e ditatorial do presidente Hugo Chávez, não é nova e foi feita no fórum legalmente adequado: a Organização dos Estados Americanos (OEA). Por isso, somente uma inspeção de missão internacional poderia tirar as dúvidas sobre o caso. Suspeitas não faltam desde que foram encontradas provas de comunicação com autoridades venezuelanas no laptop de Raúl Reyes, comandante das Farc, que acabou morrendo, em 1º de março de 2008, em combate com soldados colombianos.

Numa Colômbia marcada por mais de 40 anos de conflitos sangrentos, as Farc ganharam poder de fogo, envolvendo-se na produção de cocaína como produto gerador de renda para financiar suas atividades e aliando-se, consequentemente, a redes internacionais de narcotráfico. Numa de suas últimas entrevistas, Reyes, cujo nome verdadeiro era Luis Edgar Devia, disse ao jornalista Jacques Gomes Filho (clique aqui para acessar) que as Farc cobravam “impostos” dos traficantes que compravam coca e papoula dos camponeses, levando-nos a supor que estas perigosas relações geram ciclo perverso no qual é tênue a fronteira entre a legalidade e a criminalidade.

Acredita-se que o cultivo de coca tenha se alastrado do nordeste da Bolívia e Peru (expressivos produtores da planta) para regiões do sudoeste da Colômbia, onde a presença militar do Estado era fraca. A tal ponto, que o então presidente Andrés Pastrana criara, em 1998, a chamada “zona desmilitarizada” para facilitar o início das negociações de paz. Elas fracassaram devido à contínua violação dos guerrilheiros com sequestros e assassinatos de políticos e empresários.

Após oito anos de combates ocorridos predominantemente nas zonas rurais durante o governo de Álvaro Uribe, é certo que as Farc se reduziram a cerca de oito mil homens em comparação a mais de 16 mil, há seis anos, conforme estimativas citadas pela revista britânica “The Economist”, no mês passado. Mas a transferência de representantes de grupos paramilitares e guerrilheiros para a vida política do país representa perigo para a estabilidade democrática do país. Em 2006, mais de 60 congressistas foram investigados por suas possíveis conexões com grupos armados. Pelo menos a metade deles foi condenada.

A entrada em cena do presidente eleito Juan Manuel Santos, no dia 7 de agosto, abre certamente nova perspectiva de paz num país que conta, de um lado, com aliança militar privilegiada com os Estados Unidos graças à qual bases militares foram instaladas, mas de outro, ostenta sérias divergências ideológicas com Chávez e Rafael Correa, do Equador.

Se Chávez nada teme, por que não permite missão internacional para inspecionar seu território?

Difícil acreditar num governante histriônico que chega ao ponto de mandar exumar o cadáver do libertador Simon Bolívar para provar seu suposto assassinato ou sua morte por tuberculose, em 1830, com claro objetivo de desviar o foco das suas ações típicas de ditador, incluindo fechamento de emissoras de televisão. Na verdade, um administrador desastrado que não consegue sequer assegurar o fornecimento de bens essenciais a seu povo. Conforme dados da Cepal, são péssimas as condições econômicas do país.

Vizinhos, como Chávez, que pregam conceitos como “nação bolivariana e anti-imperialista”, aliás como defendem as Farc, podem desagregar mais do que agregar, inclusive no Mercosul.

Por isso, alianças com demagogos nitidamente autoritários e com passado golpista representam sérios riscos para sociedades democráticas na América Latina.

Ranulfo Bocayuva l Jornalista e diretor-executivo do Grupo A TARDE

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